domingo, 10 de fevereiro de 2013

Amigos Idiotas


— Ei, João!
Ele continuou andando, fingindo não ter ouvido seu nome.
— Que é isso, cara, anda logo, olha aqui!
Puxando o capuz do moletom, ele apertou o passo.
— Quer saber? Vai embora mesmo! Ninguém aqui precisa de você!
Tiago deu meia volta e trancou o portão. João continuou subindo a rua, mas sem saber para onde ia, porque àquela altura isso não tinha a mínima importância. Andava olhando para o chão e chutava cada pedrinha que aparecia na sua frente como se isso pudesse fazer sua raiva diminuir. Sua distração era tanta que nem percebeu que Olívia vinha em sua direção.
— Ai! — João levantou os olhos — Cuidado com essas pedras, seu… João?!
Ele abaixou a cabeça de novo e voltou a andar, desviando de Olívia. Ela segurou seu braço.
— Nem pense em fugir de mim.
— Eu não fujo. Só evito discussões. Principalmente com quem gosto.
— Não quero discutir, quero conversar. Você não vai pra casa do Tiago?
— Acabei de sair de lá.
— Ótimo então. Vamos andar um pouco, que tal? Eu queria mesmo ir até o mercado comprar um sorvete. Vem comigo?
— Sorvete? Ta garoando e frio pra caramba.
— Eu gosto de sorvete no inverno, e daí? Vem ou não?
Ela estendeu a mão. Meio contrariado, ele aceitou o convite.
— E então? Vai me contar o que aconteceu ou vou precisar te torturar?
— Não enche.
— Caramba, eu quero te ajudar, mas assim fica difícil! Por que vocês brigaram de novo?
— Vocês?
— Você e o Tiago.
— Não briguei com ele.
— Ele brigou com você?
— Ele deu mancada comigo.
— Que novidade.
— Você não leva nada a sério, né garota?
— E desde quando ironia é piada? O que ele fez?
— Contou. Pra todo mundo. Foi só eu sair da sala que ele abriu o bico.
Silêncio fúnebre. Olívia improvisou um coque no cabelo molhado e arrumou a saia.
— Não ta com frio?
— Não. Antes molhar as pernas do que andar com uma calça encharcada. E o moletom seca logo. Mas… como você sabe?
— Que ele contou? Simples. Eu ouvi. Ele nunca conseguiu falar baixo, você sabe. E o desgraçado ainda fez cara de paisagem quando eu voltei.
— E o pessoal?
— Não sabiam se riam ou se ficavam me olhando com aqueles olhões arregalados. Bando de imprestáveis.
— Me espera aqui, é rapidinho.
Olívia pegou um picolé no refrigerador e comprou mais umas balinhas no caixa.
— Quer?
— Não.
— Nem uma bala pra adoçar a vida? Eu diria que você ta precisando.
— To precisando mesmo é de menos amigos idiotas.
— To incluída aí?
— Nem. Ta sujo aqui.
— Valeu. — ela limpou o queixo — Quer se mudar comigo? Ir pra outra cidade, estado, país, sei lá, sumir no mundo? Seria muito legal, hein? Que tal Amsterdam?
Os dois riram, mas pararam logo.
— Não sei se abriria mão de tudo aqui. Ainda que fosse por Amsterdam.
— Nem dos seus amigos idiotas?
— Pensando bem… acho que muito menos deles.
João riu pelo nariz.
— Acho que vou lá na casa do Ti. Eles já tinham começado a assistir o filme?
— Não.
— Quer vir comigo?
— Também não.
— Beleza. Recado?
— Manda o Tiago… ah, você sabe.
— Sei sim. Mas quem costuma fazer isso com ele é você.
João já tinha virado as costas e começado a andar, ele levantou o dedo do meio e Olívia ficou gargalhando, parada na rua enquanto a chuva engrossava.
— Tsc, tsc… garotos…